Falamos muito.
Pensamos que sentimos muito.
... e agimos sem saber que, muitas vezes,
nosso movimento está descompassado com o ritmo que nos conecta à vida.
Assim, vivemos uma cultura completamente DESCORPORIFICADA.
A maior parte do tempo estamos intelectualizando a experiência, criando conceitos e ideias que justifiquem as nossas relações, o que sentimos e a nossa presença no mundo.
Esquecemos que nosso corpo também tem raízes que nos conectam com o céu e com a terra.
Sim.
Talvez o corpo seja o caminho para sairmos do automatismo e voltarmos à vida.
Mas não me refiro a esse corpo que os anatomistas legitimaram no Ocidente, senão a um corpo vivo e complexo. Um corpo que pensa, que sente e que age simultaneamente, que integra em si o dentro e o fora.
Olhar para nosso corpo é desenhar um mapa vivo da nossa experiência, é entrar em contato com o que sou.
Eu sou meu corpo, diz Stanley Keleman.
Por tanto, a forma (o desenho) do meu corpo está diretamente vinculada à forma como me relaciono comigo, com os outros e à maneira como percebo o mundo.
É lógico que um corpo colapsado vai ter ideias colapsadas.
E que um corpo muito estruturado, com músculos densos, vai produzir outra qualidade de pensamentos, bem diferentes aos pensamentos de um corpo que tende a ser inchado e mais macio.
Não existe corpo certo ou errado.
O assunto está em reconhecer se estou satisfeita com a minha condição atual ou se preciso mudar algo para me sentir melhor, mais conectada .
Perguntar-me COMO me organizo corporalmente quando penso, sinto e ajo, é uma maneira de desenhar um mapa vivo da minha experiência.
Como está a superfície do meu corpo (a minha pele) quando sinto amor, quando quero estar perto de alguém ou quando quero ficar só?
Nascemos das relações.
A cada contato surge uma nova experiência.
A vida do corpo não é uma imagem fixa.
É um criar e desfazer contínuo de realidades,
que nos diz respeito à natureza impermanente da existência.
Em 1974 a fotógrafa Claudia Andujar, com ajuda de Carlos Zacquini, apresentou canetas hidrográficas para um grupo de indígena, da etnia Yanomami, com quem já tinha contato e intimidade.
Claudia pediu para eles desenharem cenas da vida cotidiana e personagens que achassem importantes.
Conheci este trabalho numa exposição de Claudia Andujar chamada A Luta Yanomami, feita no Instituto Moreira Salles no ano 2018, em São Paulo.
Fiquei impressionada com os desenhos, porque eles mostram que o corpo é muito mais amplo e misterioso do que a nossa mente pode imaginar.
Estes desenhos mostram que a percepção da vida não tem limites.
No meu país, Venezuela, também há muitas aldeias Yanomami.
Penso que, assim como o corpo, as fronteiras geográficas também são algo vivo, em constante movimento, que nosso corpo também é terra, e que através dele podemos resgatar a experiência original de sabermos que também somos natureza.